sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Construir pontes de justiça, em vez de muros de medo





No início de Outubro, no Luxemburgo, reuniram-se delegados de 21 Comissões Justiça e Paz Europeias para refletir desafios da segurança que a Europa enfrenta no diálogo com representantes políticos, militares, instituições da União Europeia e da sociedade civil:

"Segurança da Europa: Responsabilidade dos Estados, da União e dos Cidadãos"

No final dos trabalhos aprovaram a seguinte conclusão:

“Na Europa de hoje, muitas pessoas estão profundamente preocupadas com a segurança. As suas preocupações são justificadas. Desde ataques terroristas à guerra cibernauta, desde a crise de refugiados aos efeitos das alterações climáticas, da crescente desigualdade económica e injustiça social aos elevados níveis de desemprego, desde a crise da dívida soberana ao Brexit, os Europeus enfrentam desafios de ordem social, cultural, económica e política que garantiram a segurança na Europa nos últimos tempos.

A segurança é essencial e positiva. Protege a dignidade humana a fim de que possa florescer. É uma condição prévia para a liberdade e para a busca do bem-estar e felicidade. A verdadeira segurança, portanto, deve ser limitada pelo respeito da justiça e direitos humanos (cf. Gaudium et Spes, n. 78 e n.81).

Quando a segurança está separada da justiça e dos direitos humanos, perde esse valor positivo. Em vez disso, aliena o outro, impede a troca mútua e, por fim, torna-se uma nova causa de conflito e divisão. A verdadeira segurança só pode existir na paz, e a paz engloba ser capaz de viver com – e mesmo amar - o próximo, independentemente da sua nacionalidade, cor, religião ou estrato económico.

Assim as medidas para proteger a segurança devem ser proporcionais ao respeito pela justiça e direitos humanos. Quando as leis defendem a dignidade da pessoa humana, unem a sociedade no respeito mútuo. Quando não o fazem, diminuem o Estado de Direito e minam a coesão social. O mesmo se aplica no direito internacional.

Alertamos contra a ideia de que a Europa possa alcançar a segurança para si mesma através da construção de muros. A natureza das ameaças à segurança da Europa é demasiado diversa e complexa para que os muros sejam eficazes. Em vez disso, os muros excluem e discriminam, e criam uma sensação de injustiça. A segurança para a Europa só será alcançada quando a ordem mundial for justa para toda a população mundial.

É por essa razão que a segurança da Europa será reforçada através de medidas para tornar o mundo mais justo. As instituições da Europa têm de continuar a ver para além da crise imediata, a fim de abordar a verdadeira causa do problema. Isso exige novas ideias que tenham em conta a nova realidade: a de que vivemos num mundo de recursos limitados, não ilimitados; que uma ordem mundial baseada em Estados territoriais não pode controlar o ciberespaço. Não nos esqueçamos de que as ameaças à nossa segurança surgem tanto do interior da nossa sociedade - se não mais - do que de exterior.

A segurança também é uma perceção subjetiva. A vida é frágil; nunca podemos estar completamente seguros. Se estamos receosos e ansiosos, relativamente ao grau de proximidade e veracidade do perigo, então não nos sentiremos seguros. Temos de ser capazes de distinguir entre a preocupação justificada sobre as ameaças reais e medos profundos mas infundados em relação do futuro ou aos outros.

Assim, alertamos para os medos exagerados de ameaças à nossa segurança que nos impedem de aproveitar as oportunidades positivas da atualidade. A paz é mais do que a segurança. Desta forma, o nosso objetivo tem de ser garantir que cada pessoa possa viver a sua vida com dignidade. Quando os Estados lutam para proporcionar segurança, alcançar a paz depende ainda mais da responsabilidade individual dos cidadãos para com a sociedade em que vivemos. Como cristãos, somos chamados a dar testemunho através do nosso comportamento e escolhas diários numa sociedade que respeita a justiça e dignidade humana e, assim, proporciona verdadeira segurança para todos.

Fazemos um apelo:

- à União Europeia e aos Estados Europeus, para abraçarem uma verdadeira política de paz com base no desenvolvimento humano integral e um estilo de política não-violenta que respeite a dignidade de cada pessoa humana

- aos políticos e decisores políticos a todos os níveis, para garantirem que as leis que adotam, as posições que assumem, e a linguagem que usam respeitam a dignidade humana e o princípio do Estado de Direito, em vez de refletirem uma noção redutora e auto-destrutiva da segurança para o seu próprio bem

- aos académicos, para analisarem novos conceitos para os desafios de hoje que oferecem uma perspetiva para todos

- aos meios de comunicação social e aos promotores das redes sociais, com cada vez mais influência, para desenvolverem uma maior perceção da responsabilidade ética que têm, para denunciarem discursos de ódio e evitarem incentivar os estereótipos, e para revelarem sempre o rosto da história que querem contar

- à Igreja, para que realize a sua vocação como um sacramento de paz ao serviço do mundo, um sinal visível e exemplo de como o respeito pela justiça e pelos direitos humanos, juntamente com a segurança, proporcionam os fundamentos da verdadeira paz

- a todos os cidadãos, para cumprirem a sua responsabilidade individual de construir uma comunidade mais segura e pacífica através do diálogo e um espírito de fraternidade com o próximo.”


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