Com esta jornada, celebrada a 17 de Outubro, pretende-se que
os cidadãos de todo o mundo se ponham à escuta da voz e do pensamento dos mais
pobres e sejam levados a interrogarem-se sobre o compromisso que cada um deve
assumir na luta contra a extrema pobreza através das suas ações individuais e
coletivas. O mais importante desses compromissos é honrar e respeitar a
dignidade das pessoas que vivem na pobreza, e lutar para acabar com a
discriminação, a humilhação e a exclusão social que as esmaga.
“Onde os homens estão condenados a viver na
miséria, aí os Direitos Humanos são violados. Unir-se para os fazer respeitar é
um dever sagrado”.
O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas
de “acabar com a pobreza sob todas as
suas formas e no mundo inteiro”, reconhece explicitamente que a pobreza não
provém da falta de um só fator, mas da falta acumulada de numerosos fatores
interdependentes que afetam a vida das pessoas. Devemos ir além duma definição
da pobreza que a considera simplesmente como uma falta de rendimentos ou do
estritamente necessário para assegurar o bem-estar material - como a
alimentação, o alojamento, a terra, etc. – a fim de a compreendermos plenamente
nas suas múltiplas dimensões.
A UNESCO estima que quase mil milhões de pessoas em
todo o mundo vivam em pobreza extrema, a grande maioria delas em zonas rurais
(dependentes daquilo que a agricultura lhes der para conseguirem comer). A
região do mundo mais afetada pela pobreza é a África subsariana.
A Comissão sobre Direitos Sociais, Económicos e
Culturais das Nações Unidas define POBREZA como “condição humana caraterizada por privação sustentada ou crónica de
recursos, capacidades, escolhas, segurança e poder necessários para o gozo de
um adequado padrão de vida e outros direitos civis, culturais, económicos,
políticos e sociais”, ou seja, a pobreza é a privação das condições
necessárias para ter acesso a uma vida digna.
O tema escolhido para este ano de 2016 – Da humilhação e da exclusão à participação :
eliminar a pobreza sob todas as suas formas – sublinha até que
ponto é importante reconhecer e levar em conta a humilhação e a exclusão
sofridas por quantos vivem na pobreza.
As pessoas que vivem na pobreza estão perfeitamente
conscientes da sua voz inaudível, da sua falta de poder e de independência, que
as deixam à mercê da exploração, da discriminação e da exclusão social. A
pobreza torna-as vulneráveis à indignidade, à grosseria, à humilhação e ao
tratamento desumano vindo mesmo de pessoas que trabalham nas instituições e
organizações a quem pedem auxílio. E também não conseguem participar plenamente
na vida da comunidade, o que leva à rutura das relações sociais.
A participação efetiva é não só um direito que permite a cada
indivíduo e a cada grupo participar na vida pública, mas favorece também a
inclusão social e permite verificar se as políticas de luta contra a pobreza,
sob todas as suas formas, são sustentáveis e respeitam as verdadeiras necessidades
e a dignidade humana destas pessoas.
Em
2015, em Portugal, 26.7% da população encontrava-se em risco de pobreza ou
exclusão social, 21.6% em situação de
privação material e 9.6% em situação de privação material severa. O emprego hoje já não significa garantia em relação à
pobreza, devido ao reforço da componente de baixos salários do modelo económico
dominante durante o período de austeridade e à fragilização das relações
laborais.
Como
nasceu este dia
Na origem deste dia está um homem que conheceu a extrema pobreza. O Padre Joseph Wresinski, nascido e criado num meio de grande
pobreza, “mudou-se”, em 1957, para um
bairro de lata dos arredores de Paris onde viviam 252 famílias.
"Nesse dia, atolei-me no infortúnio ",
dirá mais tarde. Doravante, empregará todas as suas energias para dar a
conhecer este povo à procura de dignidade, este povo possuidor de um pensamento
e de uma experiência únicos, indispensáveis à sociedade.
"Fiquei
possuído pela ideia que estas famílias não poderiam sair da miséria, enquanto
não fossem acolhidas, no seu conjunto, como um povo, também nos locais onde os
outros homens têm por hábito tomar decisões. Prometi a mim mesmo que, se
ficasse junto delas, faria tudo quanto estivesse ao meu alcance, para que
viessem a subir os degraus do Vaticano, do Eliseu, da ONU. (…) Não
é de alimentos nem de roupa que mais precisam, mas sim de dignidade. Precisam,
sobretudo, de não estarem dependentes do que querem ou não querem os outros,
dependentes dos caprichos da boa vontade alheia."
Em
conjunto com estas famílias criou uma associação
- Aide
à Toute Détresse
(ATD) – sob o lema: A miséria é obra dos homens. Só os homens a podem destruir.
Membro
do Conselho Económico e Social da República Francesa, desde 1979, o Padre
Joseph Wresinski redigiu um Relatório - "Grande Pobreza e Precariedade
Económica e Social" - que viria a ter repercussões sociais e políticas
importantes na Europa e no mundo. Deste modo, o povo do Quarto Mundo exprime-se
oficialmente e pela primeira vez, através da voz de um dos seus.
O
relatório reconhece a extrema pobreza como uma violação dos Direitos Humanos e
proclama que não é possível suprimi-la sem associar, logo à partida, os mais
pobres como parceiros de pleno direito. Meses depois, no dia 17 de Outubro de
1987, mais de 100 mil cidadãos, correspondendo ao apelo lançado pelo Padre
Joseph Wresinski, reuniram-se no Adro das Liberdades e dos Direitos Humanos, no
Trocadero, em Paris, onde manifestaram solenemente a necessidade de se unirem
para que o respeito pelos Direitos Fundamentais se tornasse uma realidade
universal.
Para
marcar o acontecimento foi gravada uma laje, na praça, com o seguinte apelo:
"Onde
os homens estão condenados a viver na miséria, aí os Direitos Humanos são
violados. Unir-se para os fazer respeitar é um dever sagrado."
Em
1992, as Nações Unidas reconheceram oficialmente este dia, como Jornada
Mundial para a Erradicação da Pobreza.