A
Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) acaba de publicar uma Nota, com “Um apelo face à seca que nos sufoca”.
Tendo
em conta que Portugal está, mais uma vez, em situação de seca extrema, “Temos
de repensar e refazer o nosso estilo de vida: poupar, racionalizar e partilhar,
reutilizar a água de que dispomos” – refere a Nota.
Será
que estamos verdadeiramente conscientes de que não podemos adiar, mais uma vez,
a tarefa para a qual todos somos convocados, sob pena de prejudicar gravemente
o nosso futuro comum?
Um apelo face à seca que nos sufoca
A
água, um bem precioso, está-se tornando raro à medida que continuam as
agressões do ser humano a este bem comum. Também a “água viva” indica a nossa
sede do transcendente que é também vital para renovar o sentido da nossa
presença no mundo: a água da qual somos todos responsáveis e que é causa de
divisão e de guerra na humanidade.
Num
manifesto intitulado “Avisos dos
Cientistas do Mundo à Humanidade”, cerca de 15.000 cientistas – homens e
mulheres de mais de cem países – alertam, com “considerações academicamente
sustentadas”, para aquilo que o Papa Francisco veementemente nos diz na Laudato
Si’: a Terra e a Humanidade não suportarão, por muito mais tempo, o sofrimento
que cada um e cada uma de nós lhes causamos.
“Que
fizemos do pássaro azul que nos transporta?” é a interpelação que nos faz esse
grupo de cientistas referindo o que há anos escreveu Tich Nhat Hanh, um monge
budista vietnamita: a Terra é o «gigantesco pássaro que nos leva numa viajem
extraordinária».
Já
em 2008, um Relatório da Comissão Independente sobre a População e Qualidade de
Vida publicado em diversas línguas, na secção intitulada “Respeitar os limites
da capacidade de carga da Terra” sublinha “o caráter crucial da água tanto para
a qualidade de vida como para a própria sobrevivência humana”, perguntando:
“Terão o clima, os rios e oceanos de todo o mundo capacidade para enfrentarem,
sem um colapso catastrófico, os padrões, presentes e futuros, de produção e
consumo?
Estaremos
a caminho de ultrapassar os limites da Natureza e, se assim for, que poderemos
fazer para nos mantermos dentro deles?”. Passados quase 30 anos sobre estas
interpelações constatamos que estes factos se estão a passar, e mais cedo do
que alguma vez esperaríamos.
Somos
água e não podemos sobreviver sem ela: 60% do nosso corpo é água (70% do nosso
cérebro, 80% do nosso sangue); apenas 3% da água em todo o mundo é potável,
menos de 1% é acessível para consumo; uma em 5 pessoas em todo o mundo não tem
acesso a água potável. A UNICEF indica que uma criança morre todos os quinze
segundos por doenças ligadas à água não potável. Há mais deslocados por causa
da água contaminada do que populações que se deslocam por causa das guerras. Em
média, cada português gasta por dia o dobro da quantidade máxima de água
recomendada pelas Nações Unidas.
O
nosso país está neste momento em situação de seca extrema em grande parte do
seu território, uma seca sufocante e maligna, que está e continuará a ter
repercussões irreversíveis. Seremos apenas, e mais uma vez, vítimas de um
problema mundial ou podemos lançar uma interpelação entre nós todos e a cada
um: “Que fizemos da água de que precisamos para, simplesmente, podermos
sobreviver?” A Comissão Nacional Justiça e Paz propõe que a questão seja
colocada no presente: Que queremos fazer com a água que é nosso bem comum?
Governo, responsáveis autárquicos e especialistas nesta matéria têm o
diagnóstico feito. Algumas medidas “de recurso” têm sido tomadas. A sociedade
civil está alertada para o facto de que temos de repensar e refazer o nosso
estilo de vida: poupar, racionalizar e partilhar, reutilizar a água de que
dispomos. Um alerta tão veemente pressupõe uma mudança da nossa mentalidade
consumista, imediatista e de desperdício, de horizontes estreitos,
irresponsável e narcísica.
Precisamos
de “um olhar global” mas simultaneamente de um “agir local”, aqui e agora, nas
nossas casas, nas escolas, nas comunidades e suas instituições. Precisamos de
uma pedagogia [de utilização] da água! Enquanto cidadãs e cidadãos - incluindo
crianças, jovens, idosos, nas cidades ou em zonas rurais, em empresas ou em
instituições de solidariedade – tomemos em nossos ombros e em conjunto esta
urgência, respondendo-lhe com um projeto de cidadania. Reeduquemo-nos uns aos
outros porque todos temos iguais responsabilidades, embora seja certo que
muitos estão a sofrer mais do que outros. “Todos somos pobres!” afirmou o Papa
Francisco há dias.
A
CNJP reconhece os gestos de solidariedade – individual e coletiva – perante os
desastres ambientais que nos assolam. Mas vem, simultaneamente, interpelar
novamente os cristãos e a sociedade civil: que a Água que nos dá a Vida, humana
e espiritualmente, seja por todos nós considerada – mulheres e homens de boa
vontade - um bem da Criação que nos foi confiado, limitado e escasso, é certo,
mas a que todos sem exceção temos direito.
Que
tenhamos Vida para Todos, e uma Vida em Solidária Abundância!
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