Nestas festas natalícias, serão oferecidos smartphones
para cães e impressoras 3D de panquecas que
lhe permite comer, todas as manhãs, a Mona Lisa, o Taj Mahal ou o traseiro do
seu cão. Por tralhas como essas estamos transformando em lixo o planeta vivo e as nossas próprias
perspetivas de vida. Tudo isso precisa acabar. Há alternativa: uma vida privada
frugal e bens comuns refinados. Quem se atreve?
A promessa de luxo privado para todos não pode ser cumprida: não existe nem
espaço físico nem espaço ecológico para isso
Todo mundo quer tudo – como é que isso pode dar certo?
A promessa do crescimento económico é de que os pobres poderão viver como ricos; e os ricos, como oligarcas. Mas nós já estamos atingindo os
limites físicos do planeta que nos sustenta. Desastres climáticos, desertificação do solo, colapso de habitats e espécies, mar de plástico: tudo causado
pelo excesso de consumo.
Mas o crescimento deve
continuar: esse é o imperativo político em todos os lugares. E temos de ajustar
os nossos gostos, em nome da autonomia e da escolha – o marketing usa as últimas descobertas da neurociência para destruir nossas defesas. Em cada geração, muda a
referência do consumo
normalizado. Há trinta anos, era ridículo comprar água em garrafa, pois
a água de torneira é limpa e abundante. Hoje, no mundo todo, usamos um milhão
de garrafas plásticas em cada minuto.
Quem se identifica como consumidor consciente usa mais energia e carbono do
que quem não se assume como tal
A promessa é que, pelo consumismo verde, podemos reconciliar crescimento perpétuo com sobrevivência planetária. Mas uma
série de pesquisas revela que não há diferença significativa entre as pegadas ecológicas de pessoas que cuidam e que não cuidam dos
seus impactos. Quem se
identifica como consumidor consciente usa mais energia e carbono
do que quem não se assume como tal. Porque a consciência ambiental tende a ser mais alta entre pessoas ricas. Não são as atitudes,
mas o rendimento que
determina nossos impactos no planeta. Quanto mais ricos, maior a
nossa pegada, a
despeito das nossas boas intenções. Aqueles que se vêem como consumidores verdes, dizem as pesquisas,
“focam principalmente em comportamentos que têm benefícios relativamente
pequenos”. Nada disso significa que não devemos tentar
reduzir nossos impactos,
mas precisamos ter consciência dos limites desse exercício. Nosso comportamento
dentro do sistema não consegue mudar os resultados desse sistema. É o sistema
que precisa de ser mudado.
Uma pesquisa da Oxfam sugere que o 1% mais rico produz 175 vezes mais carbono que os 10% mais pobres. Como podemos, num mundo em que supostamente todos aspiram a altos rendimentos, evitar transformar a Terra numa bola de sujeira, da qual depende toda a prosperidade?
Empresas e governos são todos procuradores do verdadeiro problema:
crescimento perpétuo num planeta que não está crescendo
Aqueles que justificam esse sistema insistem em que
o crescimento
económico é essencial para o alívio da pobreza. Mas um artigo da World Economic Review afirma que os 60% mais pobres do mundo recebem apenas 5% do rendimento adicional gerado
pelo aumento do PIB.
Disso resulta que são precisos 111 dólares de crescimento para cada dólar de redução da pobreza. Essa é a razão por que, seguindo a tendência atual,
seriam necessários 200 anos para garantir que todo o mundo receba 5 dólares por
dia.
A essa altura, a renda média per capita terá alcançado 1 milhão de dólares por
ano, e a economia será
175 vezes maior do que é hoje. Isso não é uma fórmula para alívio da pobreza. É uma fórmula para a destruição de tudo e de todos.
Consumismo verde, crescimento sustentável: isso tudo é ilusão, destinada a
justificar um modelo económico que nos está conduzindo à catástrofe
Quando você ouve que alguma coisa faz sentido do ponto de vista económico, isso
significa que é o oposto do senso comum. Aqueles homens e mulheres sensíveis
que governam os tesouros e bancos centrais do mundo, que vêem como normal e
necessário um crescimento indefinido
do consumo, estão alucinados, esmagando as maravilhas do mundo vivo, destruindo
a prosperidade das gerações futuras para sustentar um conjunto de números que
têm uma relação cada vez menor com o bem-estar geral. O sistema atual, baseado em luxo privado e imundície pública, vai nos levar à
miséria: sob esse modelo, luxo e privação são uma só besta com duas cabeças.
Necessitamos de um sistema diferente, enraizado não
em abstrações económicas mas
em realidades físicas, que estabeleça os parâmetros pelos quais nós possamos julgar
da sua saúde. Necessitamos construir um mundo no qual o crescimento não seja um
imperativo, um mundo de frugalidade privada e luxo público.
(O artigo é de George Monbiot, jornalista, escritor e ambientalista do Reino Unido,
publicado por The Guardian.)
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